A Lei de Benefícios da Previdência Social classifica como acidente de trabalho aquele decorrente do exercício da atividade laboral ou de atos relacionados às funções desempenhadas pelo trabalhador. Nesse contexto, acidentes que envolvem o uso de veículo durante a jornada de trabalho — como transporte de carga, de passageiros ou do próprio trabalhador — são reconhecidos como acidente de trabalho.
No artigo 21, a legislação previdenciária também equipara o acidente de trajeto — quando o evento ocorre no deslocamento habitual entre a casa e o local de atividade — a acidente de trabalho. Dados mais recentes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) indicam que 24,6% dos acidentes de trabalho no país ocorreram nesse percurso.
Paulo Guimarães, CEO do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), observa dados do Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (AEAT-2023) e afirma que os deslocamentos vinculados ao trabalho, sejam eles parte da jornada laboral ou trajetos de ida e volta, representam uma parcela expressiva dos sinistros de trânsito no Brasil.
“Os acidentes de transporte durante a jornada de trabalho, classificados nos códigos V01 a V99 da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), somam 19.791 ocorrências em um total de 732.751 acidentes de trabalho registrados no Brasil”, comenta o executivo.
O profissional destaca que o levantamento referente aos dados de 2023 mostra mais de 150 mil acidentes de trajeto no Brasil e os dados, segundo a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), apontam que alguns setores produtivos são mais impactados por acidentes de trânsito relacionados à atividade laboral.
“Os cinco setores mais impactados concentraram cerca de 30 mil ocorrências, correspondendo a 19,72% do total. O destaque é para o setor de Atividades de Atendimento Hospitalar (CNAE 8610), responsável por 11.839 casos, equivalentes a 7,74% de todos os registros. Também figuram entre os mais afetados os setores de supermercados, transporte de cargas, restaurantes e administração pública”, detalha o CEO.
Guimarães ressalta que os sinistros de trânsito relacionados ao trabalho produzem impactos diretos e sistêmicos sobre os indicadores de gestão corporativa. Ele pontua que o absenteísmo aumenta imediatamente devido à necessidade de afastamento para recuperação médica e, paralelamente, há elevação dos custos operacionais diretos e indiretos.
“Os acidentes comprometem a produtividade pela interrupção de tarefas, sobrecarga de equipes remanescentes e pela curva de aprendizado de substitutos. Além disso, aumenta os gastos com seguros, tratamentos, ações judiciais, contratação, treinamento de substitutos e retrabalho. Esses efeitos combinados refletem uma redução geral na competitividade e sustentabilidade organizacional”, enfatiza o profissional.
Fatores de risco e medidas preventivas
O CEO do Observatório explica que as principais causas e comportamentos de risco associados a acidentes de trânsito no contexto de trabalho são multifatoriais, e envolvem sobretudo falhas humanas e pressões organizacionais.
Entre os fatores, Guimarães destaca condução distraída, excesso de velocidade e desrespeito às normas de trânsito, fadiga, manutenção inadequada dos veículos, condução sob influência de álcool ou substâncias psicoativas e negligência às condições adversas de via e clima.
“Os comportamentos advêm especialmente pelo uso de smartphones, por prazos de entrega e metas de produtividade e por jornadas extensas ou mal planejadas. Em conjunto, esses elementos ampliam significativamente o risco de sinistros e demandam ações estruturadas de prevenção e gestão da segurança viária laboral”, complementa o executivo.
Conforme especifica o especialista, as práticas mais eficazes entre medidas preventivas no campo da educação viária e da gestão corporativa se estruturam nos pilares de seleção e capacitação, práticas de Recursos Humanos (RH), monitoramento e controle operacional, equipamentos de proteção, plano de resposta a emergências, procedimentos pós-acidente/incidente e escolha e gestão do veículo.
“A redução dos índices de acidentes de transporte exige uma abordagem integrada, que combine gestão corporativa responsável, educação contínua e monitoramento operacional. Essa integração de ações educativas, operacionais e humanas constitui o eixo central de uma cultura organizacional voltada à segurança viária, essencial para a preservação da vida e a sustentabilidade das operações empresariais”, defende Guimarães.
O enfrentamento requer integração de dados, fortalecimento da governança interinstitucional e ampliação das práticas de educação viária. Para o representante do Observatório, a segurança viária deve ser compreendida como um valor coletivo e transversal, que ultrapassa o campo das políticas de trânsito e se estende aos ambientes corporativos, educacionais e comunitários.
“A construção de uma cultura de segurança viária no ambiente laboral depende da atuação coordenada entre o poder público, que estabelece normas e instrumentos de fiscalização, o setor privado, central na implementação prática, garantindo que decisões considerem a segurança como valor inegociável e a sociedade civil organizada, que mobiliza, sensibiliza e articula esforços intersetoriais”, conclui.
Para mais informações, basta acessar: onsv.org.br/






























